EDIÇÃO 42 » COLUNA NACIONAL

Mão Complicada no English Poker Open


Felipe Mojave

Sabe aquelas vezes em que você está no meio de uma mão importante, começa a pensar em muitas coisas, seu raciocínio se embaralha e você perde o rumo? Não foi isso o que aconteceu comigo no English Poker Open, em Londres, em outubro passado. Quando tudo parecia complicado, acabei encontrando uma luz graças ao raciocínio que apliquei na mão. Mesmo assim, minha decisão ainda não foi a ideal.

Os blinds eram de 400-800 e eu tinha 38K. Abri raise de 2.050 em middle position com A 9. Meu oponente, um jogador escandinavo muito inteligente e agressivo, deu call do button. Ele tinha 40K. O flop veio K K 9 e eu apostei 3.200. Ele, muito depressa, deu raise para 8.200.

Como o bordo tinha um flush draw e dois reis, a situação era bem complicada. Eu o coloquei em três possíveis combinações: 1) ele estava protegendo uma mão forte como AA ou QQ; 2) ele realmente tinha acertado a trinca de reis com KQ, KJ ou KT; ou 3) ele estava testando a força da minha mão com um flush draw, algo como AQ, AJ ou AT.

Em um cenário indefinido como esse, e com duas das três combinações cogitadas sendo desfavoráveis para mim, a primeira coisa que me veio à cabeça foi dar fold, muito embora, contra aquele tipo de oponente e naquele flop, a jogada mais indicada fosse o check-call.

Contra um adversário com fichas, posição e inteligência, as ideias e possibilidades vieram à minha cabeça como uma rajada de vento. Parei para analisar aquela jogada por muito tempo. Assim, ele já sabia que eu não tinha um Rei e muito menos 9-9, o que deixou minha ação ainda mais complicada.

Decidi dar call e analisar a postura dele no turn. Bateu um A. Com três cartas de espadas, descartei ele ter ás e outra de espadas. Ele poderia ter algo como J T, é claro, mas aquela carta já esclarecia muita coisa. Dei mesa. Ele rapidamente deu mesa em seguida. Vimos um 5 no river.

Nesse instante, eu acreditei que ele poderia ter algo como JJ e, por consequência, ele daria fold caso eu apostasse. Imaginei também que o fato de eu ter pensado muito no flop poderia ter dado a ele a imagem de que eu tinha o flush draw.

De qualquer modo, ainda me senti muito desconfortável com aquela situação. Decidi que o check-call seria a linha mais adequada, até porque não vi grande valor em apostar no river. E eu poderia realmente me complicar na mão: se ele voltasse all-in, eu não poderia pagar de maneira alguma.

Pedi mesa. Ele pensou por um minuto mais ou menos e foi all-in! Meu pai do céu! Foi uma mega-aposta que eu, num primeiro momento, tinha convicção de que não poderia pagar e então cair do torneio numa mão tão estranha.

Só que, depois de analisar de novo a ação, ficou fácil perceber que ele achava mesmo que eu tinha uma mão forte e que uma aposta pelo valor seria facilmente paga: levando em conta que eu ainda ficaria com cerca de 30 big blinds caso desse fold, uma aposta forte me faria desconfiar de um blefe, e isso tornaria possível o call.

No intuito de fazê-lo mostrar as cartas, eu dei fold com meu Ás aberto e consegui o que queria: “Achei que você tinha o flush e que iria me pagar. Bom fold”, disse ele enquanto mostrava um belo AA.

É claro que eu, que já tinha pensado em desistir da mão no flop, fiquei muito contente com esse fold no river. No final das contas, acabei ficando em quarto no torneio. Mas fiquei pensando: por que eu não consegui largar no flop e economizar 5K? Eu quase me compliquei de verdade nessa mão, pois ganhei novas informações que poderiam ter me confundido, quando eu claramente teria que dar fold no flop, de acordo com minha análise para a jogada mais indicada ali.

Muitas vezes, é bem difícil concretizar um raciocínio com tantas variáveis (sem falar que existe a opção de dar call para ganhar mais informações e refinar a análise). Essa mão me chamou muito a atenção nesse sentido, pois, apesar de saber que a situação era bastante desfavorável para mim no flop, tive que sacrificar mais algumas fichas para me livrar daquela mão.

Achei interessante comentar esse caso com vocês, pois queria mostrar que a busca por informações para ter uma definição muitas vezes é importante – até quando a gente sabe que tem que dar fold, quer buscar mais certeza.

O fato é que, em muitas situações, por mais que a gente junte as variáveis, ainda vai haver indefinições. Na maioria delas, a jogada mais indicada é dar fold mesmo e partir para a próxima jogada, sem complicar muito.




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